10.16.2006

33 – Dies Irae.

Tremei, mortais, pois que impende sobre nós a consumação dos tempos. Eu, que aprendi no livro do apóstolo João os sinais da besta imunda, do anunciado anticristo, conheço agora que a sua hora é chegada. Escutai, como eu escutei, as sete trombetas, vede, como eu vi, o romper dos sete selos, admirai, como eu admirei, o celestial galope dos quatro terríveis cavaleiros, esses quatro magníficos que vão remir a humanidade, destruindo-a. Temei o julgamento Daquele que está sentado, pois serão poucos os escolhidos, e muitos os condenados. Receai uma só coisa, mas fazei-o com toda a vossa alma: receai o sétimo dia!

Serve esta crónica para falar do apocalipse, e de como este está próximo. Desenganem-se os iludidos, pois é a esses que peço que abram os olhos, e vejam os sinais. Desde há muito que os quatro cavaleiros campeiam pelo mundo fora. A Peste vestiu roupagens mais modernas, e responde hoje pelos nomes de Sida, e de cancro, mas nem por isso é menor a sua pestilência. A Fome tem em avença metade do globo, e a Guerra por toda a parte decide os humanos destinos. Sobre os ricos despojos que estes três vão deixando, triunfa o sinistro cavalo pálido, cujo cavaleiro se chama Morte.

Resta então saber o seguinte, como se tem saído a mesa 19, neste turbulento final dos tempos? Como sempre, a nossa mesa está em sintonia com as grandes realidades, e também nela se tem visto o quebrar dos selos, também dela se têm escutado as ominosas trombetas. Prenunciou a primeira neve e gelo, e a atitude da Vânia para connosco arrefeceu. Com a segunda, tingiu-se de sangue a terça parte das águas dos rios e dos poços, e a Vânia pintou o cabelo com um tom mais escuro. Note-se que o cabelo da Vânia é, precisamente, um terço dos cabelos femininos que aí nos servem.

Há ainda as duas bestas do apocalipse. A primeira, vinda da terra, semelha um enorme urso, enquanto a segunda provirá do mar. Ora bem, já há algum tempo que o Zé Eduardo anda embezerrado como um urso, se é que os ursos podem parecer bezerros, e não é ilegítima a metáfora. Mais recentemente, o Rui Constâncio deu em passar toda a refeição calado, lembrando, pelo porte, postura e inacção, uma versão ampliada de um cavalo-marinho, embora a barba estrague um pouco o efeito. O hábito que o Paulo Sousa adquiriu recentemente, de se vestir de santola, não se enquadra bem nesta teoria, o que conduz à suspeita de que se trate apenas de uma manobra dele, para despistar.

Por falar nisso, o nosso Paulo tem um segredo. Gostava de o contar aqui, mas não posso, porque é segredo. Isto não significa, como se poderia pensar, que eu me comprometi a manter a coisa confidencial, mas sim que não posso mesmo contá-lo, porque também é segredo para mim. Ele não mo conta, porque diz que não sou de confiança. De qualquer modo, a coisa é intrigante: quando um indivíduo é um reconhecido pederasta, com toda a fibra moral de uma feijoada, e uma marcada apetência por pornografia alternativa, que outro segredo poderá ainda ter, que considere embaraçoso?

Estou apenas a brincar, como é evidente. O nosso amigo Paulo não é nenhuma dessas coisas. É mesmo, estou disposto a jurá-lo, uma das santolas mais porreiras que conheço, mas está-me a irritar não saber o seu segredo. O assunto veio à baila numa altura em que a mesa discutia episódios diversos, todos envolvendo o acto de cagar fora do penico. Tudo leva portanto a crer que o segredo do Paulo se enquadre neste esquema de merda, fazendo assim jus à sua proveniência de Bostis Merdix 7. Ou isso, ou então será outra merda qualquer.

E deste modo vamos indo, sempre receosos dos calamitosos portentos que nos aguardam. A Vânia está cada vez mais ríspida, e ameaça-nos a torto e a direito. É evidente que é ela o Sentado, que virá separar os justos dos culpados, lançando estes últimos nas eternas labaredas infernais. Bem se vê que já nos julgou, e estamos todos condenados a descer às catacumbas.

Está visto, vamos passar a eternidade na cave do restaurante, com o ar condicionado desligado. Não importa, mais tarde haverá luar, e talvez um penico para o Paulo, também.

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